Da redação da Rede Hoje

São Francisco de Assis (batizado como Giovanni di Pietro di Bernardone; Assis, 1181 ou 1182 — 3 de outubro de 1226), foi um frade católico nascido na atual Itália. Depois de uma juventude irrequieta e mundana, voltou-se para uma vida religiosa de completa pobreza, fundando a ordem mendicante dos Frades Menores, mais conhecidos como Franciscanos, que renovaram o Catolicismo de seu tempo.

Com o hábito da pregação itinerante, quando os religiosos de seu tempo costumavam fixar-se em mosteiros, e com sua crença de que o Evangelho devia ser seguido à risca, imitando-se a vida de Cristo, desenvolveu uma profunda identificação com os problemas de seus semelhantes e com a humanidade do próprio Cristo.

Sua atitude foi original também quando afirmou a bondade e a maravilha da Criação num tempo em que o mundo era visto como essencialmente mau, quando se dedicou aos mais pobres dos pobres, e quando amou todas as criaturas chamando-as de irmãos. Alguns estudiosos afirmam que sua visão positiva da natureza e do homem, que impregnou a imaginação de toda a sociedade de sua época, foi uma das forças primeiras que levaram à formação da filosofia da Renascença.

Dante Alighieri disse que ele foi uma "luz que brilhou sobre o mundo", e para muitos ele foi a maior figura do Cristianismo desde Jesus, mas a despeito do enorme prestígio de que ele desfruta até os dias de hoje nos círculos cristãos, que fez sua vida e mensagem serem envoltas em copiosa fé e darem origem a inumeráveis representações na arte, a pesquisa acadêmica moderna sugere que ainda há muito por elucidar quanto aos aspectos políticos de sua atuação, e que devem ser mais exploradas as conexões desses aspectos com o seu misticismo pessoal.

Sua vida é reconstituída a partir de biografias escritas pouco após sua morte mas, segundo alguns estudiosos, essas fontes primitivas ainda estão à espera de edições críticas mais profundas e completas.

Pela tradição católica, papas assumem uma nova identidade quando chegam ao poder. Mais do que uma mera formalidade, o nome abraçado também procura, não raras vezes, trazem a mensagem que o líder católico pretende imprimir à sua época.

E Bergoglio se tornou Francisco. O primeiro papa da história da Igreja com este nome. Sem dúvida nenhuma, naquele instante, o argentino estava apresentando sua proposta ao mundo, numa espécie de plano de governo, antecipando o que viria a ser a tônica do seu pontificado.

Num contexto histórico em que a tragédia climática e ambiental parece irreversível, papa Francisco é uma voz lúcida acerca da necessidade de proteção ecológica, do "cuidado com a casa comum", como ele tanto clama. E num momento de crise da humanidade, ele insiste na importância do acolhimento e no fundamental da caridade e da inclusão dos mais pobres.

Papa Francisco ecoa, oito século depois, os princípios de um dos santos mais famosos da história do cristianismo: São Francisco de Assis, cuja data é celebrada pelos católicos no dia 4 de outubro — de acordo com a tradição, ele morreu na noite do dia 3 para o dia 4 de outubro de 1226.

Alguns costumam comparar que houve "o Francisco de Assis e agora há o Francisco de Roma", como lembra o teólogo Luiz Carlos Susin, também frade franciscano, professor na Pontifícia Universidade Católica no Rio Grande do Sul e na Escola Superior de Teologia e Espiritualidade Franciscana.

Biografia

Nascido em 1181 ou 1182 na cidade de Assis, atual Itália, ele foi batizado como Giovanni di Pietro di Bernardone e era filho de uma família relativamente bem-sucedida.

Seu pai, Pietro di Bernardone dei Moriconi, era um comerciante têxtil que tinha bom tráfego entre a burguesia estabelecida na época. Sua mãe, Pica Bourlemont, era uma mulher de raízes francesas.

Não há consenso sobre o seu apelido Francisco. Provavelmente, era uma referência à França. Para alguns biógrafos, porque desde pequeno o menino tinha encantamento pelo idioma, pela música e pela cultura francesa.

Para outros, seria uma homenagem da família aos parentes franceses da mãe. O que parece não haver dúvidas é que se trata de um nome que foi assumido antes da vida religiosa — ou seja, desde a tenra juventude Giovanni já era chamado de Francesco, em português Francisco, pelos seus amigos.

E teria sido uma juventude bastante agitada. Visto como excêntrico e indisciplinado, Francisco gostava de festas, bebida e não economizava o dinheiro do pai na hora de se divertir.

Por volta dos 23 anos, ele passou a ter uma série de visões místicas. Aos poucos, passou a se desinteressar pelos prazeres mundanos e convenceu-se que o melhor seria adquirir hábitos mais frugais e próximos dos pobres. Depois de um retiro em uma caverna, decidiu que não queria se casar — mas, sim, abraçar a vida religiosa.

Sonhos com mensagens avaliadas por ele como divinas passaram a ser recorrentes. E certa vez ele, ao ouvir os sinos que os leprosos eram obrigados a usar para alertar as pessoas do risco de contágio, em vez de afastar-se, aproximou-se.

A repulsa deu lugar ao cuidado: Francisco deu seu manto ao homem que sentia frio e sentiu um prazer inexplicável ao ver, em seus olhos, a gratidão.

Para os seus biógrafos, esse foi o ponto de virada em sua biografia, quando ele realmente decidiu dedicar-se aos pobres. Em seguida, Francisco pegou o estoque de tecidos do seu pai, vendeu a preços módicos no centro da cidade, e doou todo o dinheiro para a Igreja.

Pietro revoltou-se e descobriu o filho escondido em um celeiro. Levou-o para casa e deixou-o preso, acorrentado, no porão. Com a ajuda da mãe, Francisco conseguiu escapar. E foi procurar abrigo junto ao bispo.

O pai seguiu os passos, pretendendo tirar satisfações não só com o filho, mas também com o líder religioso da região. Para a surpresa de todos, Francisco debateu com o pai, tirou todas as suas vestes e devolveu-as a ele.

Renunciou a qualquer direito que teria como herança e partiu, nu, para uma vida entre os pobres. O bispo teria abençoado o jovem e admirado sua postura.

Isso teria ocorrido provavelmente em 1208. No ano seguinte, Francisco fundaria seu grupo religioso, a Ordem dos Frades Menores, com princípios claros de serviço aos pobres, humildade e uma profunda ligação com a natureza.

Essa postura de Francisco, com boas doses de rebeldia nas condutas para conseguir realizar seus ideais humanitários, faz com que muitos vejam seu papel como o de um verdadeiro reformador dos valores da Igreja Católica.

"Em minha visão, ele foi um homem estupendo que, mesmo antes de [Martinho] Lutero [(1483-1546), que rompeu com a Igreja e fundou o protestantismo] questionou a Igreja. Alguns pesquisadores dizem que ele foi um reformador sem sair da Igreja, pois questionava a riqueza e via a pobreza como algo significativo", afirma o estudioso de hagiologias Thiago Maerki, pesquisador da Universidade Federal de São Paulo associado da Hagiography Society, dos Estados Unidos.

"Francisco tinha uma postura humilde, era o santo da alegria e fazia tudo pela paz. Pensava nos outros, tinha empatia, se preocupava com aqueles que forem", comenta.

E sua atualidade também reside nesse fato. "A preocupação com os que sofrem é uma pauta contemporânea. Ele falava isso na Idade Média, criticando a miséria, o poder o status do clero que não ligava para os que necessitavam. Foi um santo extremamente complexo", analisa Maerki.

"Suas ideias vão ao encontro daquilo que geralmente se prega no mundo contemporâneo, cada vez mais capitalista, material e do 'eu sem pensar no outro'."

Para o pesquisador, a figura de Francisco de Assis se tornou "extremamente simbólica" justamente porque em uma "época em que muitos defendiam a riqueza, inclusive a hierarquia eclesiástica", ele acabaria, em sua ordem, decretando que os frades tinham de habitar casas mais simples, ter uma vida mais simples. "O hábito franciscano era a roupa das pessoas pobres da época", exemplifica.

"Ele era uma pessoa antissistema, uma pessoa desconcertante. Estava sempre ao lado dos pobres, mas conseguia dialogar e trazer essa vida para o seio da Igreja", analisa Guimarães. "Ele fez um processo radical de fraternidade com os mais pobres, mudando seu status de vida para ser pobres e isso é sempre significativo."

Narrativas

Pesquisar sobre a vida e a obra de São Francisco é mergulhar em uma seara de múltiplas facetas. Por um lado, muitos de seus contemporâneos escreveram sobre ele, com as primeiras hagiografias tendo sido feitas pouco tempo após sua morte, em 1226. Contudo, os primeiros franciscanos também se viram em meio a uma guerra de narrativas.

Segundo o pesquisador, a versão oficializada foi a que predominou até o século 17, quando estudiosos passaram a resgatar outros relatos antigos sobre Francisco a fim de compor o mosaico de sua vida. No momento, o próprio Maerki está trabalhando em uma biografia de São Francisco escrita originalmente em português, do século 16 — em breve, uma edição da mesma preparada pelo pesquisador brasileiro deve ser lançada em livro. Trata-se da obra 'Crônicas da Ordem dos Frades Menores', escrita pelo franciscano Marcos de Lisboa (1511-1591) em 1557.

Natureza

Se hoje São Francisco é visto como o santo mais ligado ao meio ambiente, é preciso lembrar que essa noção não encontra eco nos discursos de seu tempo. Em carta apostólica publicada em novembro de 1999, o papa João Paulo 2º. (1920-2005) proclamou São Francisco como "o celestre padroeiro dos cultores da ecologia".

"São Francisco faz um movimento muito forte de integração. Ele abre a ideia de sermos irmãos de toda a criação", explica Guimarães ao G1. "Um caminho intenso de ser fraterno. Por isso ele é o santo das relações saudáveis e integradas, convidando-nos a um reajuste nas diversas relações com a sociedade, buscando uma vida com o próximo, com Deus e com toda a criação."

Literatura

Francisco de Assis deixou escritos de punho próprio. Sua obra mais conhecida é o famoso 'Cântico das Criaturas', também chamado de 'Cântico do Irmão Sol'. O texto foi composto originalmente no dialeto da região da Úmbria e é apontado como um dos primeiros registros escritos no idioma italiano.

"Francisco é considerado por muito teóricos como o primeiro poeta italiano e isso não é pouca coisa", lembra Maerki. "Foi um dos primeiros a escrever poesia no vernáculo italiano, no dialeto umbro. Torna-se muito importante para a literatura italiana."

Esse reconhecimento não é algo apenas dos dias atuais. Considerado o maior poeta da língua italiana, Dante Alighieri (1265-1321) dedicou a São Francisco todo o cântico 11 reservada ao paraíso de sua obra-prima, A Divina Comédia.

Fontes: Wikipedia e G1