O vidro é um material sólido, amorfo e pode ser utilizado nas mais variadas aplicações como construção civil, indústria em geral, como nos carros e nas embalagens, apresentando propriedades de conservação do seu conteúdo por ser impermeável, mau condutor térmico e não reagente. Além disso, o vidro cumpre os requisitos sustentáveis por ser possível sua reutilização e reciclagem sem perdas em massa.

Uma embalagem de vidro, que pode ser facilmente moldada na sua fabricação, assume ainda formas e tamanhos variados em sua fabricação, o que permite criatividade na concepção de seu design. Talvez por isso e pelas suas propriedades de conservação, sejam os contentores vítreos tão amplamente utilizados na indústria de alimentos e bebidas.

Quando o assunto é sustentabilidade, contudo, sua importância é fundamental para a indústria de embalagens, visto que a mescla de cacos de vidro na produção de novos produtos reduz o consumo de recursos naturais como areia, barrilha e calcário, além de reduzir o consumo de energia e, consequentemente CO2, pois o caco já processado uma vez permite diminuir a temperatura de fundição nos fornos.

Contudo, é possível ser ainda mais sustentável ao retornarmos a um hábito passado, a de utilização de embalagens retornáveis. Uma garrafa de vidro, por exemplo, pode ser envasada mais de 20 vezes, sendo que embalagens produzidas na década de 1990 ainda são encontradas no mercado. Mesmo com marcas externas de rolagem na fabricação, o líquido é preservado e livre de contaminantes, assegurado pela correta limpeza interna e externa nas linhas de produção. Um hábito que era obrigatório até a década de 1970, quando surgiram as primeiras latas, e foi gradualmente substituído pelo comodismo dos consumidores, as garrafas de 300, 600 e 1.000 mL podem voltar à casa dos consumidores, gerando apenas levar as embalagens vazias para trocar no distribuidor, seja mercado, venda ou qualquer local de compra. O custo é menor, o planeta e a sociedade agradecem.

Mas essa não é a solução única e desejável para nosso país, que apresenta dimensões continentais e diferentes realidades e desafios como, por exemplo, a dificuldade logística devido à distância entre ponto de consumo e os fabricantes e recicladores. Nesse caso, ao menos para as bebidas, as latas e pets ainda são soluções viáveis, desde que retornem para os recicladores.

A dificuldade ainda é enorme na recuperação de resíduos sólidos urbanos, visto que menos de 5% da massa das embalagens produzidas retornam para processos produtivos. Apesar de a partir da década passada começarem as regulações e acordos para fazerem valer a Política Nacional dos Resíduos Sólidos de 2010, o que culminou em leis nacionais intensificando essa agenda.

Como exemplo, os recém-publicados decretos federais 11.413 e 11.414, ambos de 13 de fevereiro de 2023, estabelecem diretrizes para os créditos para reciclagem de embalagens e, para a inclusão socioeconômica de catadoras e catadores, respectivamente. Ambos ampliam as leis existentes, estabelecendo, inclusive, novas alternativas além do crédito de logística reversa que fora oficializado no ano de 2022.

Iniciativa em andamento na parceria de empresas com o SENAI/CNI, a iniciativa da Circularidade do Vidro une empresas, instituições de pesquisa e desenvolvimento e universidades do país, no propósito de recuperação e reutilização das embalagens de vidro no território nacional. A iniciativa, que trata exclusivamente das embalagens de vidro, mas está alinhada com outras que visam a integração dos diversos atores do ecossistema de produção e reciclagem, tem como principais objetivos o aumento da utilização de embalagens retornáveis, da captação do resíduo pós-consumo e da busca de soluções alternativas para a reutilização do vidro em novos processos produtivos, quando a logística inviabiliza o retorno para as fábricas de embalagens.

A mobilização da indústria, das instituições, da academia e da sociedade faz-se necessária com o intuito de aumentar a captação desse material que, apesar de representar somente 2,7% do total de resíduos sólidos urbanos no Brasil, corresponde a uma produção total de 980.000 toneladas por ano.

A chamada recebeu 22 propostas, totalizando R$ 50 milhões em investimentos com propostas de todas as regiões do país. As propostas foram agrupadas em três grupos, sendo: (1) soluções inovadoras em novos produtos a partir do vidro; (2) aumento na captação do vidro a partir de plataformas, equipamentos e serviços; (3) educação e treinamento para aumento da conscientização sobre a reciclagem do vidro.

Nos próximos passos está a execução agrupando empresas e instituições, além de contar com fomentos governamentais. Essa é uma das iniciativas que visam proporcionar a coleta e a reciclagem dos materiais pós-consumo, contribuindo tanto para o ambiente quanto para a sociedade, bem como para o desenvolvimento sustentável da indústria brasileira.

*Professor da Escola de Engenharia (EE) da Universidade Presbiteriana Mackenzie (UPM) e gerente corporativo de Sustentabilidade e Melhoria Contínua do Grupo Petrópolis.