Audiência na Assembleia reúne trabalhadores, governo e oposição em torno da proposta que extingue a exigência de referendo popular para desestatização de estatais.


Trabalhadores ocuparam auditórios e áreas externas da Assembleia Legislativa em protesto contra a proposta do governo Zema. Foto: Daniel Protzner

Da Redação da Rede Hoje

A proposta de privatização da Companhia de Saneamento de Minas Gerais (Copasa) voltou ao centro do debate político e social no Estado. Nesta quarta-feira (24), a Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) sediou uma audiência pública marcada por protestos de trabalhadores, sindicatos e parlamentares da oposição.

O encontro foi realizado pela Comissão do Trabalho, da Previdência e da Assistência Social, a pedido de 14 deputados. O objetivo foi discutir os impactos da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 24/2023, de autoria do governador Romeu Zema (Novo), que retira a exigência de referendo popular e quórum qualificado para autorizar a privatização de estatais.

A mobilização reuniu centenas de funcionários da Copasa, que ocuparam o Auditório José Alencar e o Espaço Democrático José Aparecido de Oliveira, além de parte da Praça da Assembleia. Munidos de cartazes e faixas, os trabalhadores entoaram palavras de ordem contra a desestatização e o governador.

O deputado Betão (PT), presidente da comissão, afirmou que o governo tem insistido em um modelo que prioriza a privatização em áreas estratégicas. Segundo ele, medidas semelhantes já foram observadas em setores como energia e saúde.

De acordo com o parlamentar, a venda da Copasa poderá comprometer o acesso a serviços básicos, especialmente entre a população de baixa renda. Ele citou exemplos de experiências em outros estados para justificar sua posição contrária.

Governo quer vender
O governo, por sua vez, defendeu a necessidade de adesão ao Programa de Pleno Pagamento das Dívidas dos Estados (Propag). O secretário-adjunto de Desenvolvimento Econômico, Frederico Amaral e Silva, destacou que a privatização da Copasa é parte fundamental desse processo.

Segundo ele, a proposta garante um abatimento imediato de 20% do saldo da dívida estadual, criando condições favoráveis para renegociação junto à União. Essa seria, na avaliação do Executivo, uma medida de impacto para reequilibrar as contas públicas.

Frederico argumentou ainda que a legislação federal já permite a ampliação da participação privada no saneamento básico. Ele lembrou que o Marco Legal do Saneamento estabelece metas até 2033, com universalização do acesso à água em 99% das residências e de esgoto em 90%.

Na visão do governo, a Copasa, sob gestão privada, teria maior capacidade de atrair investimentos, ampliar sua cobertura e cumprir as metas do marco regulatório. A proposta também prevê o fortalecimento da Agência Reguladora de Saneamento e Energia de Minas Gerais (Arsae).

O Executivo apresentou o Projeto de Lei (PL) 3.739/25, que busca modernizar os mecanismos de gestão da agência, garantindo, segundo o secretário, mais transparência e eficácia na fiscalização dos serviços prestados.

Precarização
A oposição, porém, sustenta que a mudança pode levar à precarização do serviço. A deputada Bella Gonçalves (Psol) destacou que experiências anteriores de privatização resultaram em aumento de tarifas e queda na qualidade.

Ela citou o caso da Enel em São Paulo como exemplo de insatisfação popular com a empresa privada. Para a parlamentar, o risco é que a água, considerada um bem essencial, seja transformada em um produto de difícil acesso para parte da população.

Durante a audiência, Bella Gonçalves também denunciou casos de assédio moral e cortes de benefícios na Copasa, afirmando que medidas de enfraquecimento da empresa antecedem a discussão sobre a venda.

BTG Pactual 
Outro ponto levantado foi o suposto envolvimento do banco BTG Pactual no processo. Segundo a deputada, a instituição teria acesso a informações privilegiadas e poderia lucrar com a queda do valor das ações da empresa no mercado.

O deputado Celinho Sintrocel (PCdoB) parabenizou a mobilização dos trabalhadores, reforçando que a pressão popular é essencial para barrar a PEC. Já Leleco Pimentel (PT) pediu que a base do governo reveja sua posição e retire a proposta de tramitação.

Os sindicatos presentes defenderam a permanência da Copasa como empresa pública, destacando sua importância para o desenvolvimento regional e para a manutenção de empregos diretos e indiretos no Estado.

Representantes dos trabalhadores afirmaram que a privatização traria prejuízos para a população, além de comprometer a continuidade de projetos de abastecimento e saneamento em municípios menores.

A audiência, que se estendeu durante toda a manhã, não chegou a um consenso. De um lado, o governo insiste na privatização como solução fiscal. De outro, trabalhadores e parlamentares contrários à proposta afirmam que a medida ameaça direitos e serviços essenciais.

A discussão sobre a PEC 24/23 deve prosseguir nas próximas semanas na Assembleia Legislativa. O texto precisa ser aprovado em dois turnos, com maioria absoluta, para alterar a Constituição estadual e viabilizar a venda da Copasa sem referendo popular.

Enquanto isso, o clima de polarização tende a se intensificar. De um lado, o governo articula apoio na base aliada para aprovar a proposta. De outro, sindicatos e movimentos sociais prometem novas mobilizações para tentar impedir a privatização.


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