Unanimidade na comissão contrasta com aprovação expressiva na Câmara; texto deve ser analisado ainda hoje pelo plenário do Senado.


Sessão da CCJ reuniu senadores de vários partidos, que se posicionaram contra a PEC 3/2021, conhecida como PEC da Blindagem. Foto: Geraldo Magela/Agência Senado

Da Redação da Rede Hoje

Rejeição unânime na CCJ

A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado rejeitou, por unanimidade, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 3/2021, apelidada de PEC da Blindagem. A votação aconteceu nesta quarta-feira (24) e registrou 27 votos contrários, sem qualquer manifestação a favor.

A proposta previa que deputados e senadores só poderiam ser processados criminalmente com autorização prévia das respectivas Casas, em votação secreta. O texto também estendia a regra a deputados estaduais e distritais, ampliando a prerrogativa parlamentar.

O presidente da CCJ, senador Otto Alencar (PSD-BA), informou que a rejeição segue ainda nesta quarta-feira para apreciação no plenário do Senado. Segundo ele, há acordo para encerrar a tramitação do texto o quanto antes.

Relatório pela rejeição

O relator da matéria, senador Alessandro Vieira (MDB-SE), defendeu o arquivamento. Em seu parecer, argumentou que a proposta apresentava “desvio de finalidade” e poderia abrir brechas para que o crime organizado se infiltrasse no Congresso Nacional.

Vieira rejeitou também emendas apresentadas por senadores que tentavam modificar o conteúdo, como Sérgio Moro (União-PR), Carlos Portinho (PL-RJ) e Magno Malta (PL-ES). Para ele, não havia possibilidade de ajustes que tornassem o texto aceitável.

Contraste com a Câmara

A PEC havia sido aprovada na Câmara dos Deputados por 353 votos favoráveis, resultado que surpreendeu pela amplitude da base de apoio. Porém, a reação da sociedade civil foi imediata, com protestos em diversas capitais no último domingo (21).

As manifestações apelidaram a proposta de “PEC da Bandidagem” e cobraram posicionamento firme do Senado. A pressão popular foi destacada por diversos parlamentares durante a sessão da CCJ.

Críticas de parlamentares

A senadora Eliziane Gama (PSD-MA) classificou o texto como uma tentativa de criar uma “casta de privilegiados” no Brasil. Para ela, a PEC tinha como objetivo blindar políticos de investigações criminais.

O senador Humberto Costa (PT-PE) lembrou que, após a aprovação na Câmara, deputados chegaram a rezar em plenário, gesto que gerou críticas. Ele afirmou que a rejeição no Senado representa a “queda da máscara” de setores da extrema direita.

Já o líder da oposição, senador Carlos Portinho (PL-RJ), considerou a PEC absurda. No entanto, fez questão de frisar que deputados de diferentes correntes políticas apoiaram a proposta na Câmara, incluindo a base do governo.

Risco de infiltração criminosa

Segundo Portinho, a imunidade processual prevista no texto poderia favorecer organizações criminosas. Ele citou como exemplo um caso no Rio de Janeiro, em que um integrante do Comando Vermelho chegou a ocupar vaga no parlamento estadual.

O líder do MDB no Senado, Eduardo Braga (AM), também criticou duramente a PEC. Para ele, a medida desrespeitava a democracia e representava um retrocesso inaceitável no sistema político brasileiro.

Na avaliação de especialistas, a aprovação da PEC criaria obstáculos para o combate à corrupção, sobretudo em processos envolvendo uso irregular de emendas parlamentares. O tema foi amplamente mencionado na audiência.

Imunidades em debate

Os senadores também discutiram a diferença entre imunidade material e imunidade processual. A primeira já está garantida pela Constituição, protegendo opiniões, palavras e votos. A segunda, que a PEC pretendia ampliar, foi considerada excessiva.

O senador Omar Aziz (PSD-AM) lembrou que a imunidade processual teve origem na Constituição de 1988, quando o país saía de um período de ditadura. Hoje, segundo ele, não há justificativa para resgatar esse tipo de proteção.

Aziz ainda afirmou que a proposta não pode ser vista como defesa da democracia, mas sim como um instrumento de impunidade. Ele considerou o texto “imoral”, sem ligação com ideologia partidária.

Casos concretos no centro da discussão

Casos concretos também entraram no debate. O senador Marcos do Val (Podemos-ES), investigado pelo STF, foi citado como exemplo da controvérsia sobre os limites da imunidade parlamentar.

O senador Eduardo Girão (Novo-CE) defendeu que há exageros na atuação do Supremo, mas reconheceu que a PEC foi além do razoável. Para ele, a Câmara “errou na mão” ao aprovar o texto em primeiro turno.

Já o líder do governo no Congresso, senador Randolfe Rodrigues (PT-AP), destacou que nenhum direito é absoluto. Ele disse que a imunidade não pode ser usada como pretexto para ofensas, ameaças ou apologia ao crime.

Randolfe citou o caso do ex-presidente Jair Bolsonaro, que em 2014 ofendeu a deputada Maria do Rosário (PT-RS), como exemplo de situações em que a imunidade não pode ser confundida com liberdade de expressão ilimitada.

Expectativa para o plenário

Com a rejeição unânime na CCJ, a expectativa é de que o plenário do Senado também descarte a proposta ainda nesta semana. A tendência, segundo líderes partidários, é de ampla convergência contra a PEC.

O episódio marca um contraste com a votação expressiva na Câmara, revelando a força da mobilização social e a diferença de postura entre as duas Casas do Congresso em relação ao tema.


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