Igreja Matriz Nossa Senhora do Patrocínio, em estilo, colonial no ano de 1918.
 Acervo público



Revelações.
As históricas são fascinantes. Com anotações e crônicas de um grande intelectual patrocinense, Odair de Oliveira, mais fatos pitorescos da (nossa) Patrocínio, no período 1830-1912. Os tiroteios, as disputas bélicas, as brigas, enfim, as cenas de “far west” que foram intituladas fogos. Nesse tempo, além da famosa família Rabelo, surgiu também a família Botelho. Sempre é cultural conhecer um pouco essa época de coronéis (título dado aos poderosos economicamente).

QUASE VINTE FOGOS – Mais de dez sedições (revoltas) ocorreram no século XIX. As primeiras entre 1830 e 1840 no município de Araxá (nessa ocasião, Patrocínio fazia parte do município araxaense); as outras em 1842 em Bagagem, Paracatu, Araxá e Patrocínio, e, em 1848, 1852, 1853 (Patrocínio), 1855, 1858, 1865 (Patrocínio), 1868, 1888, 1889 e 1912. Uma fartura de batalhas e guerrilhas.

1842: CLÃ OTTONI COMANDAVA A AGITAÇÃO – A Província de Minas Gerais tinha 42 municípios. Havia uma revolução de Liberais contra Conservadores. Os Liberais eram chefiados pelo Theophilo Benedito Ottoni (da família do juiz assassinado em Patrocínio, mais tarde). Araxá e Patrocínio sediavam um núcleo de combates, de batalhas, que se espalharam pelo Triângulo e Goiás.

A RAZÃO DAS CONFUSÕES – A distância da região até à capital provincial, Ouro Preto, fazia que a viagem de ida e volta, a cavalo, demorasse 40 dias. Ou seja, a decisão ficava longe. Assim, a ânsia pelo poder e essa distância fortaleciam a ação de líderes comunitários, independentes de esferas superiores. Aí, surgiam as discórdias de liderança.

A VEZ DA FAMÍLIA BOTELHO CRIAR ANARQUIA – Uma sedição ocorrida em 1865 está registrada na Ata de reunião do Conselho do Estado, presidido pelo imperador D. Pedro II. Refere-se aos acontecimentos em Bagagem (Estrela do Sul), e, envolvendo Patrocínio. Houve tentativa de matar um dos coronéis Botelhos. Ao lado dos eventuais/possíveis autores estavam o juiz de Direito e o juiz Municipal. Esse juiz determinou a remoção (transferência) dos presos de Patrocínio para Araxá. Os Botelhos não aceitaram. Gerou violento conflito. O Juiz Municipal de Patrocínio publicou despacho de despronúncia (anulação) da prisão dos eventuais autores do atentado. Porém, o Delegado de Patrocínio não acatou. Em seguida, o Juiz de Direito expediu a ordem de habeas corpus. O Delegado também não a aceitou. A desordem na Comarca estava instalada.

A NOVELA DOS BOTELHOS PROSSEGUE... – Os dois juízes, com força armada, apresentaram para tirar da prisão os pronunciados (acusados do crime). Os Botelhos, com o apoio do Delegado, instauraram a sedição (perturbação da ordem) e desejavam prender os dois juízes. E um terceiro juiz (suplente do juiz Municipal), em 48 horas expediu mandato de prisão contra os Botelhos. Assim, Bagagem ficou dividida em dois arraiais. De um lado, os coronéis Botelhos com os Guardas Nacionais. De outro lado, o juiz de Direito se cercou com os inimigos dos Botelhos.

A INTERVENÇÃO DO GOVERNADOR – O Presidente da Província (assim era denominado o governador) agiu com severidade. Demitiu os juízes de Direito e Municipal de Patrocínio. E retirou das mãos dos Botelhos o comando da Guarda Nacional, na região. E nomeou novo Delegado de Polícia para Bagagem, com sessenta (60) homens da Guarda Nacional.

CORONÉIS: DEPOIS DOS BOTELHOS, OS RABELOS – Segundo Odair de Oliveira, o deputado Joaquim Antônio de Souza Rabelo, que venceu as eleições para o Senado, era radical monarquista. O juiz Eloy Ottoni, um radical republicano. A Proclamação da República estava se aproximando.

MINHA MULA SERÁ BARONESA!” – O historiador Cornélio Ramos (Academia de Letras de Catalão-GO) contou que o Cel. Rabelo, receoso de perder sua liderança, tentou se aproximar do adversário juiz Ottoni. Convidou-o para um jantar em sua casa. Durante o jantar, o Juiz teria ofendido o anfitrião (Cel. Rabelo). Parte da conversa:
O meu amigo Imperador Pedro II me nomeará como o primeiro Barão de Patrocínio, caro Juiz, disse o deputado patrocinense no Império.
No dia em que o Senhor for Barão, minha mula será Baronesa! respondeu o destemido e atrevido, para não dizer mal educado, Ottoni.

A MORTE ESTAVA DECRETADA – Com o total desrespeito à sua pessoa, Cel. Rabelo não aceitou as desculpas posteriores. E contratou, por meio de seus irmãos Rabelo, João Afonso (filho mais violento do Índio Afonso) para assassinar o juiz Ottoni. A emboscada se deu no município de Patrocínio (região de Coromandel e Abadia dos Dourados, hoje). Nessa época, Índio Afonso (pai) já tinha sido assassinado/morto em Bagagem (Estrela do Sul). E o Cel. Rabelo se encontrava no Rio de Janeiro para a confirmação imperial de sua vitória eleitoral para o Senado (à época, o Imperador tinha que ratificar a eleição).

POR FIM – Esses tiroteios não pararam. Os fogos continuaram. Próximas edições, a conclusão dessas batalhas. Inclusive a versão de Cornélio Ramos sobre a morte do emblemático Coronel Rabelo. Haja história!
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