O Brasil enfrenta uma epidemia de dependência em jogos, conforme apontam pesquisadores especializados em jogo patológico.

Crédito de imagem: Pete Linforth | Pixabay

Da redação da Rede Hoje

Servidores do Ministério da Fazenda, encarregados de desenvolver as regras para o mercado de apostas no Brasil, realizaram 251 reuniões com representantes de casas de apostas (bets) ou associações que as representam, enquanto profissionais da área da saúde foram consultados apenas em cinco ocasiões. A informação foi divulgada pelo Instituto Conhecimento Liberta (ICL), com base em uma reportagem do jornalista Paulo S. Teixeira, publicada na Folha de S. Paulo.

Atualmente, o Brasil enfrenta uma epidemia de dependência em jogos, conforme apontam pesquisadores especializados em jogo patológico.

A análise, feita pela Folha de S. Paulo, envolveu 555 compromissos realizados entre integrantes dos ministérios da Fazenda e da Saúde entre março de 2023 e 31 de julho de 2024. No dia seguinte, o governo publicou as regras de "jogo responsável." Os dados foram extraídos do site E-agendas e processados com auxílio de inteligência artificial. Dos encontros registrados, 381 estavam relacionados ao mercado de apostas, e 251 envolveram diretamente representantes de casas de apostas ou suas associações.

Entre os principais envolvidos nas reuniões estavam Regis Dudena (secretário de Prêmios e Apostas), José Francisco Manssur (ex-assessor especial da Secretaria Executiva da Fazenda), Simone Vicentini (ex-secretária adjunta de Prêmios e Apostas) e Sônia Barros (diretora do Departamento de Saúde Mental do Ministério da Saúde). O ministro Fernando Haddad participou de sete desses encontros.

Para discutir a estrutura regulatória a ser adotada no Brasil, Manssur estabeleceu reuniões semanais com as duas principais entidades representativas dos sites de apostas: o Instituto Brasileiro de Jogo Responsável (IBJR), que representa marcas europeias, e a Associação Nacional de Jogo Legal (ANJL), que reúne empresas de outras regiões do mundo.

Essas reuniões ocorriam todas as quintas-feiras e continuaram sob a condução de Vicentini, mesmo após a saída de Manssur em fevereiro. A sequência de encontros foi interrompida apenas por Dudena, nomeado secretário de Jogos e Apostas em maio.

Após deixarem o governo, Manssur e Vicentini passaram a liderar a banca de apostas esportivas no escritório CSMV Advogados.

O texto das novas regras, que foi elogiado pelo setor de apostas por sua semelhança com as normas de Gibraltar, Malta e Curaçao (onde muitas das casas de apostas estão sediadas), recebeu críticas por não abordar o investimento em saúde necessário para o tratamento de jogadores patológicos.

Durante o período analisado, a Secretaria de Saúde Mental do Ministério da Saúde realizou quatro reuniões com servidores envolvidos na regulamentação dos sites de apostas e uma reunião adicional com uma casa de apostas para discutir o tema.

No total, a Secretaria de Prêmios e Apostas (SPA) realizou 13 reuniões com o Instituto Brasileiro de Jogo Responsável, que defende um mercado regulado sob a justificativa de maior segurança jurídica para o setor. O presidente do IBJR também é responsável pela subsidiária do gigante sueco Betsson, que recentemente formalizou sua intenção de atuar no mercado brasileiro.

Representantes da ANJL, que inclui a grega Betano e a americana Caesars Sportsbook, participaram de dez reuniões com a SPA. Ambas as entidades afirmaram que compartilharam com o governo informações baseadas em suas experiências em mercados regulados no exterior.

Profissionais de saúde, que se consideraram excluídos das discussões sobre a regulamentação, criticaram a falta de foco em investimentos em ambulatórios especializados, na formação de profissionais de saúde mental para lidar com o vício em jogos, e na promoção de campanhas de conscientização.

Os ministérios da Saúde e da Fazenda informaram que planejam criar um grupo de trabalho em 2025, com o apoio das casas de apostas que estiverem em conformidade com a nova regulamentação.

O Pro-Amjo, o único ambulatório especializado em vício em apostas no Brasil, localizado no Hospital das Clínicas da USP, não foi consultado pela SPA durante a formulação das políticas de jogo responsável. A portaria publicada no último dia 31 delineia as regras que visam conter o jogo patológico a partir do próximo ano.


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