Mensagens interceptadas indicam que um grupo de manipuladores teria investido cerca de R$ 250 mil para fraudar partidas e beneficiar apostadores.

Foto: Whashington Prates


Anderson Ibrahin Rocha, ex-gestor de futebol do Patrocinense


Da redação da Rede Hoje

Saiu nesta sexta-feira, agora no G1 da Globo, nova reportagem sobre a manipulação de resultados envolvendo o Patrocinense. Já havia saído nesta quinta, 12, no GE, agora especificamente sobre o Patrocinense sai essa hoje, assinada pelo repórter Leonardo Lourenço do G1.

A situação do Patrocinense se agrava à medida que surgem mais detalhes sobre os problemas envolvendo a gestão do clube. O atual presidente, que também se considera vítima, se colocou à disposição da Polícia Federal para colaborar com qualquer investigação. Por outro lado, o ex-presidente Roberto Avatar, o Tatá, fez o possível para impedir que o dirigente Anderson Ibrahim, assumisse o cargo de executivo de futebol. Em uma reunião, que contou com a presença da Rede Hoje, Tatá recusou-se a assinar o contrato proposto por Anderson Ibrahim, o que evidencia o desconforto e a oposição à sua gestão.

Outro alerta importante foi dado por Tiago Pires, gerente de futebol à época, que veio de Patos de Minas, onde também enfrentou problemas relacionados ao dirigente. Por isso Pires deixou o Patrocinense, previu que o clube teria problemas com a direção e tentou alertar a diretoria, mas suas palavras não foram levadas em consideração. A diretoria não compreendeu a gravidade da situação, o que agora reflete nos problemas enfrentados pelo clube.

Segundo a reportagem, a Polícia Federal investiga um esquema de manipulação de resultados envolvendo o Patrocinense, clube de Minas Gerais, durante a Série D do Campeonato Brasileiro deste ano. Mensagens interceptadas indicam que um grupo de manipuladores teria investido cerca de R$ 250 mil para fraudar partidas e beneficiar apostadores. No entanto, o plano foi descoberto, gerando prejuízos aos investidores e desconfianças entre os envolvidos.

Em relatório enviado à Justiça, a PF concluiu que houve manipulação no jogo entre Inter de Limeira e Patrocinense, disputado em junho, pela primeira fase da Série D. Os apostadores teriam conhecimento prévio de que o time mineiro perderia o primeiro tempo por pelo menos dois gols. A partida terminou 3 a 0 para a equipe paulista, com todos os gols marcados ainda na primeira etapa. Os lances incluíram um gol contra e falhas graves da defesa do Patrocinense.

Entre os investigados estão o ex-gestor do clube, Anderson Ibrahim Rocha, o técnico Estevam Soares, o auxiliar técnico Rodolfo Santos de Abreu, além dos jogadores Felipe Gama Chaves e Richard Sant Clair Silva. A investigação revelou que o clube foi arrendado pela empresa de Rocha, a AIR Golden, com o objetivo de atender interesses de apostadores, sob a promessa de investimentos de R$ 600 mil na fase de grupos da competição.

As conversas obtidas pela PF mostram que Rocha buscava parcerias internacionais para manipular resultados. Em uma troca de mensagens com um empresário ucraniano identificado como Jan, Rocha teria dito: “Precisaria de um investimento, mas é um trabalho muito seguro, com 12 atletas confiáveis. Sou o diretor executivo, contratei a comissão técnica, que segue minhas ordens”. Ele chegou a pedir US$ 25 mil para iniciar os trabalhos.

Dúvidas sobre a integridade das partidas surgiram em maio, após a derrota do Patrocinense por 4 a 1 para o Pouso Alegre, gerando suspeitas na imprensa local. Em mensagens obtidas pela PF, o técnico Estevam Soares demonstrou preocupação com as acusações, afirmando: “Os primeiros que vão se ferrar é o executivo, o treinador. Jesus! Se tiver um tempinho aí, me dá uma ligação que estou com isso na cabeça”.

Foto: Whashington Prates
Estevam Soares ao lado de Anderson Rocha na Patrocinense 


A análise do celular do treinador Estevam Soares revelou conversas reveladoras, incluindo uma com uma mulher identificada como Roseli, que seria sua conselheira espiritual, segundo a Polícia Federal. Nessa troca, Roseli sugeriu que Estevam não aceitasse a proposta de trabalho do Patrocinense, mas ele desabafou:

– Eu vou tomar esse banho de louro aí. A coisa aqui está meio pesada na barra. Aqui não é o que eu pensei não. Fora de campo que está me preocupando um pouco. Estamos surgindo alguns problemas aqui, meio esquisito, sabe?

Outro diálogo relevante foi com o atacante Thiago Ribeiro, ex-Santos, que havia deixado o Patrocinense pouco antes. Thiago, que já sabia das dificuldades financeiras de Estevam antes de ele assumir a equipe, o aconselhou a se demitir, considerando os problemas enfrentados pelo time:

– O gol contra do Richard foi escandaloso, coisa pra sair preso do estádio. Por isso eles queriam tanto que o Richard jogasse – afirmou Thiago Ribeiro, referindo-se ao gol contra marcado por Richard Sant Clair, conhecido como Richard Bala, no jogo contra a Inter de Limeira.

Estevam, em outras conversas, também revelou as dificuldades de relacionamento com a direção do clube. Thiago Ribeiro foi enfático em sua opinião sobre a situação:

– Sai daí, professor. O senhor não precisa passar por isso. Eu sei que o senhor está precisando do dinheiro do salário, que o senhor precisa trabalhar. Mas não dá para aceitar isso, professor.

Ele continuou:

– A responsabilidade disso é toda do Anderson, pois foi ele quem montou esse elenco. E já falei com o senhor que ele monta um time ruim de propósito. É para o time perder mesmo. Aí junta ruindade com desonestidade (como acontece com alguns jogadores aí), é tragédia na certa.

Após a derrota para o Inter de Limeira, Estevam foi demitido do Patrocinense, no dia 3 de junho, dois dias depois da partida, quando o contrato entre o clube e o AIR Golden já estava rompido. Ele foi indiciado pela Polícia Federal, mas negou participação no esquema de manipulação de resultados durante depoimento. Procurado pela reportagem, Estevam não quis comentar.

Na sequência, Anderson Rocha, gestor do clube e nome central nas investigações, trocou mensagens com Wesley, um homem que lhe perguntou se ele ainda estava em Patrocínio após o rompimento do contrato devido às suspeitas de fraude nas partidas.

– Estou, mas vou hoje para (São José do) Rio Preto. Não sou louco – respondeu Rocha.

Wesley perguntou sobre os resultados da partida contra o Inter de Limeira, e Rocha se mostrou insatisfeito com o que ocorreu:

– Não deu certo como gostariam. Nem recuperaram o investimento, depois veio essa bomba – disse Rocha, referindo-se ao investimento de aproximadamente R$ 250 mil que, segundo ele, foi feito em suas contas. Ele reclamou da situação:

– Investiram em torno de uns R$ 250 mil nas minhas contas, entendeu? Mas porra, eu não imaginava que ia acontecer o que aconteceu, de não dar certo ou de perder o clube. Eles pagaram os meninos, os jogadores, até onde eu sei não pagaram o Rodolfo (assistente) também e não me pagaram, mano. Simplesmente falei que não se recuperou e que a gente precisa ver o que vai fazer.

Anderson Rocha convida Jan a investir no CAP para manipular resultados — Foto: Reprodução

Esse desabafo de Rocha reflete o caos que se instaurou no clube após a sequência de resultados controversos e o envolvimento de manipuladores de apostas nas partidas. As investigações da Polícia Federal continuam, enquanto as suspeitas de manipulação de resultados ganham cada vez mais força.

A Polícia Federal continua investigando a manipulação de resultados no futebol brasileiro, com um foco específico no jogo entre Patrocinense e Inter de Limeira, ocorrido no início de junho. As investigações revelaram uma série de trocas de mensagens e diálogos que indicam a participação de diversos envolvidos em um esquema de manipulação de partidas.

Em uma das conversas analisadas, Anderson Rocha, empresário e gestor do Patrocinense, desabafa sobre sua situação e os prejuízos decorrentes da manipulação de resultados:

Liguei pro Rodolfo e falei que nunca mais vou mexer com essa porra de jogo. Minha cara está exposta, estou com um monte de BO para resolver, processo, um monte de coisa na empresa a troco de nada. Ah, mas não deu dinheiro? Foda-se. Manda pelo menos uma parte para eu poder sobreviver com minha família aqui – reclamou Rocha.

Ele continua sua queixa sobre a falta de apoio dos envolvidos no esquema:

Os caras não têm um pingo de consideração para nada. Minha cara que está lá, minha empresa que está lá, e mesmo assim os caras não tiveram a capacidade de mandar sei lá R$ 5 mil, e falar: "ó, paga aí teu aluguel, suas coisas aí, segura a bronca e vamos correr atrás do prejuízo".

Rodolfo Santos de Abreu, o Dodô, ex-jogador de confiança de Rocha, foi colocado na comissão técnica de Estevam Soares como assistente. A investigação aponta que Dodô teria sido designado com a intenção de repassar informações ao empresário. Em abril, Rocha mandou uma mensagem a Dodô avisando que ele trabalharia com Estevam e solicitou que ele mantivesse os jogadores "sob controle":

Fala para os moleques não ficarem de brincadeira. Não fique de muita amizade com eles para evitar desconfiança – escreveu Rocha.

Antes da partida contra o Pouso Alegre, que terminou em derrota por 4 a 1, Dodô informou a Rocha sobre a escalação prevista. Rocha, então, comentou sobre as expectativas para o time, mostrando que o fracasso da partida poderia ser parte de um plano maior:

Temos sete (jogadores) – respondeu Rocha, dando a entender que o jogo poderia ser manipulado.

A derrota levantou suspeitas na imprensa local, e Rocha ficou desconfiado, sugerindo que alguns jogadores poderiam estar vendendo informações para outras pessoas envolvidas no esquema:

Usaram meu nome. Se eu tivesse procurado, ia ser porque você pediu e eu ia te falar. Eu não tenho saída em nenhum cassino, não conheço ninguém de cassino – escreveu Dodô.

Fique em paz, a gente já sabe quem é – respondeu Rocha, indicando que já tinham identificado os responsáveis.

Com o objetivo de pressionar os jogadores a seguirem as ordens do esquema, os dois discutiram formas de intimidar os atletas. Em uma conversa, Dodô sugere uma atitude violenta:

Tem que pegar um para exemplo, mano. Tem que quebrar pelo menos as pernas, se não matar um cara. Tá ligado? Dar um tiro na perna. E fazer cuspir dinheiro – sugeriu Dodô.

Rocha, então, pede a Dodô para falar com os jogadores e apagar todas as mensagens trocadas entre eles:

Teu mano lá invejoso para você o áudio e fez a foto com a peça (arma) e as munições – questiona Rocha, referindo-se a novas ameaças aos jogadores.

Apesar de todas as suspeitas, o AIR Golden continuou mantendo Estevam Soares como treinador do Patrocinense por mais um mês, até a derrota para o Inter de Limeira, que precipitou o rompimento do contrato. Quase todos os envolvidos foram chamados para depor à Polícia Federal, mas negaram qualquer envolvimento nos esquemas de manipulação de resultados.

Rodolfo foi intimado a depor virtualmente, mas não compareceu à audiência marcada. Richard Bala, jogador que participou da partida contra o Inter de Limeira, afirmou não ter visto nada de anormal durante o jogo, assim como o goleiro Felipe Gama. Marcos Vinicius da Conceição do Nascimento, suposto investidor do esquema, disse que foi convidado por uma pessoa conhecida como “Neymar do Japão” para ajudar a pagar os salários do clube. A reportagem do ge não conseguiu contato com eles.

Polícia Federal investiga jogo do Patrocinense por manipulação de resultados. Foto: Polícia Federal/Divulgação

Anderson Rocha, em depoimento à CPI que investiga manipulação de resultados no Senado, negou ser o chefe do esquema fraudulento. Ele tentou justificar a formação do time, destacando que, devido ao baixo nível técnico da Série D, erros em campo são comuns:

Sabendo que tinha jogadores jogando em posições que não eram delas de origem, numa situação em que a gente não tinha um banco, jogando contra o então líder, que é um adversário que a gente tinha que respeitar demais, porque estava invicto na competição... Se você errar contra jogadores técnicos melhores, você está fadado a dar certo. Isso faz parte da bola. E, como você disse, na Série D, infelizmente, o nível técnico é muito baixo – disse Rocha.

Em junho, durante uma operação da Polícia Federal, tanto o Inter de Limeira quanto o Patrocinense afirmaram estar colaborando com as investigações. O caso gerou um amplo debate sobre a vulnerabilidade de clubes menores a esquemas de manipulação. A Polícia Federal continua investigando o envolvimento de outras pessoas e possíveis tentativas de fraude em outras partidas.

Veja a matéria original foi publicada pelo G1.


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