O relatório apresentado pelo Cenipa sinaliza que se pode considerar a questão da formação de gelo como um importante fator para a queda da aeronave
Crédito: reprodução TV Câmara
Arte usada as explicações do Cenipa sobre o acidente na Câmara dos Deputados.
Cássio Thyone Almeida de Rosa*
do Fonte Segura**
Há exatamente duas semanas, comentamos em nossa coluna anterior neste Fonte Segura, que procuraríamos examinar os primeiros resultados da investigação tão logo fossem divulgados. De forma bastante célere, as primeiras informações oficiais foram apresentadas na forma de um Relatório Preliminar, divulgado no último dia 6 de setembro, pelo Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa), órgão ligado à Força Aérea Brasileira (FAB) e responsável pelas investigações no âmbito preventivo.
O avião da Voepass caiu no dia 9 de agosto, uma sexta-feira, na cidade de Vinhedo, no interior paulista. A aeronave transportava 62 pessoas, sendo 58 passageiros e quatro tripulantes. Não houve sobreviventes. O voo 2283 saiu de Cascavel (PR) e iria para Guarulhos.
Os resultados preliminares foram apresentados pelo Brigadeiro do Ar Marcelo Moreno, chefe da Seção de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos do CENIPA.
Em uma investigação desse tipo, as análises abordam fatores agrupados (materiais, operacionais e humanos) que resultam em uma visão multicausal dos acidentes e as causas são referidas em termos de fatores contribuintes.
Desde o início, pelas características verificadas nas imagens do acidente, além do histórico anterior envolvendo o modelo da aeronave, a formação de gelo nas asas do avião surgiu como uma das hipóteses levantadas por especialistas e que poderiam estar relacionadas à queda da aeronave.
Segundo o Brigadeiro do Ar Marcelo Moreno:
“O que temos até o momento é que houve uma fala extraída por meio do cockpit que um dos tripulantes indicava que havia uma falha no sistema de De-Icing (antigelo). Isso todavia não foi confirmado do sistema de dados (FDR)“.
O FDR é o equipamento de gravação de dados de parâmetros de voo extraídos de uma das chamadas “caixas pretas” da aeronave.
Outro participante das investigações, o tenente-coronel Paulo Mendes Fróes, também do Cenipa, informou que:
“Os tripulantes comentam sobre falhas no sistema de boot das asas (os que quebram o gelo). Na primeira vez, durante a subida, temos o comandante, o piloto em comando, comentando através do CDR [sistema de comunicação], que existia ali uma falha do sistema de airframe. Dois minutos antes do acidente, relatou ‘bastante gelo'”.
O tenente-coronel também relatou que o copiloto, dois minutos antes do acidente, relatou “bastante gelo“. Segundo ele:
“Existiram duas vezes nos gravadores de voo de voz. Em uma delas, o piloto comenta que houve falha no sistema de airframe [antigelo]. Na segunda delas, o copiloto comenta ‘bastante gelo’. Foram duas vezes que foi comentado durante o voo de 1h e 10 minutos sobre o gelo”.
Durante as investigações iniciais, o Cenipa também descobriu que o sistema antigelo do avião foi acionado algumas vezes pelos pilotos durante o voo. Mas que, em determinado momento, o avião voou seis minutos com aviso de gelo sem que o sistema de degelo tenha sido ligado.
Outra informação importante é a de que os pilotos não relataram emergência em nenhum momento do voo, segundo os investigadores.
Sobre o sistema antigelo do avião, o relatório preliminar informa que foi ligado e desligado várias vezes durante o voo, entretanto não é possível afirmar, até o momento, se o sistema era desligado pela tripulação ou se alguma outra condição estava desligando o mecanismo. Nenhuma hipótese está descartada.
Em outra abordagem investigativa, o Cenipa informou que os registros de manutenção do avião estavam atualizados, embora isso não signifique, necessariamente, que as manutenções tenham sido realizadas com qualidade, o que deverá ser analisado minuciosamente. Em relação às licenças necessárias, o avião estava de acordo com a documentação exigida e era certificado para voos em condições de gelo.
Ainda de acordo com o relatório, os pilotos também tinham treinamento específico para voos em condições de gelo, realizado em simuladores. E que era previsto que o avião enfrentaria zona de formação de gelo em sua rota.
O relatório apresentado pelo Cenipa ainda não aponta qual foi a causa do acidente, portanto, ainda não é possível dizer que uma falha levou à queda. Entretanto mostra indícios que permitem considerar a questão da formação de gelo como uma importante contribuição para a queda da aeronave.
Sobre as perícias voltadas à identificação dos corpos, até o momento 30 deles foram entregues aos familiares e, nos trabalhos, continua a busca pela precisão necessária no tempo o mais curto possível.
*Cássio Thyone Almeida de Rosa é graduado em Geologia pela UnB, com especialização em Geologia Econômica. Perito Criminal Aposentado (PCDF). Professor da Academia de Polícia Civil do Distrito Federal, da Academia Nacional de Polícia da Polícia Federal e do Centro de Formação de Praças da Polícia Militar do Distrito Federal. Membro do Conselho de Administração do Fórum Brasileiro de Segurança Pública
** Fonte Segura é o site do Fórum Brasileiro de Segurança Pública