Sensacional. É a história do Índio Afonso. Herói ou Criminoso? Bandido ou artista? Um patrocinense oriundo do fogo (casa) 206, conforme Mapa Populacional, de 1832 e complementado em 1835, arquivado no Arquivo Público Mineiro. Nesse caso, ajustamos o que o célebre pesquisador de Paracatu, José Aluísio Botelho, publicou (“fogo” 207). O Índio Afonso agiu no território compreendido entre Patrocínio e Catalão (GO), com predominância de ter vivido às margens do Rio Paranaíba. Foi morto em 1887, conforme o jornal Gazeta de Uberaba. Bernardo Guimarães, juiz de Catalão, em 1860/1861, e que conhecia bastante Patrocínio, pois o seu irmão (Joaquim Caetano Guimarães) tinha sido juiz no Município por volta de 1853, escreveu sobre o Índio Afonso. Isso em 1872. Um ano depois, terminou de escrever o conto/novela, intitulado Índio Afonso. Misturou a realidade com a sua imaginação. Os locais bem similares aos da realidade. A obra tornou-se épica. Um romance para ser lido. Nele, Bernardo Guimarães descreve um verdadeiro herói do sertão. Onde Afonso é a sua celebridade destemida.
 
PALAVRAS DE BERNARDO GUIMARÃES – “... o Índio Afonso é personagem real e vivo ainda. Sua figura, costumes, maneiras, tom de voz, modo de vida, são tais quais o descrevi, pois tive ocasião de vê-lo e conversar com ele.” Guimarães, ainda disse que a maioria dos feitos e proezas do Índio Afonso é criação de sua imaginação. E que em Catalão ouviu diversas façanhas do afamado caboclo. Por fim, escreveu: “... se o Índio Afonso é um bandido ordinário, um facínora e ignóbil, pouco me importa... o Índio Afonso de meu romance não é o facínora de Goiás...
 
ARMADO DOS PÉS À CABEÇA – Forte e armado. Assim, descreveu o famoso escritor. Da raça de mestiços, viveu como nômade, subsistindo quase de caça e pesca. Afonso tinha estatura colossal e de organização atlética. Guimarães: “... de ordinário anda só, mas sempre armado, desde os pés até a cabeça, com excelentes armas, de que sabe usar com incrível destreza. Além de sua espingarda, de dois canos, que nunca lhe sai do punho, traz ao cinto duas pistolas de dois tiros, uma formidável garrucha, a indispensável faca e uma pequena foice. Desta maneira, ele só com uma sua valentia vale por vinte; é como um fortim ambulante”. Se Bernardo Guimarães assim descreveu Afonso, provavelmente viu algo semelhante à margem do Rio Paranaíba, que ele escreveu como “Rio Parnaíba”. 

NADAVA COMO PEIXE... CORRIA COMO VEADO... – Segundo Bernardo, para pegar um bezerro/boi no campo, Índio Afonso não usava laço nem pedia ajuda. Em pouco tempo, e animal estava no chão, imobilizado. As sombrias florestas eram consideradas jardins para o valente homem do mato. Sua fisionomia era alegre, bondosa expressão e fala mansa. E não tinha medo de jacaré, sucuri ou canguçu (onça). Porém, tinha receio da polícia. 

PRIMEIRO CRIME: CASTROU AGRESSOR DE SUA IRMÃ – No romance de Guimarães, Afonso vivia com a irmã, o seu marido e dois filhos. Certo dia, à beira do Parnaíba (Paranaíba), um valentão de nome Toruna, que desejava incessantemente a sua irmã Caluta, a todo custo, aproveitando da ausência de Afonso e de seu cunhado Batista (foram caçar), tentou violentá-la. Índio Afonso o perseguiu, localizou e o castrou, com requintes de crueldade. Cortou-lhe também os beiços (para não beijar ninguém mais), o nariz e as orelhas. Ensanguentado, o ex-valentão seguiu para o arraial de Caldas, a só meia légua de distância, de onde fora encontrado por Afonso. Como não havia médico nem curandeiro lá, Toruna morreu, horas depois. Assim, esse crime de Índio Afonso chegou à capital de Goiás, nesse romance meio realidade, meio ficção. 

POLÍCIA GOIANA NÃO CONSEGUE PRENDÊ-LO – Por três vezes, em três momentos diferentes, a polícia tentou aprisionar o Índio Afonso. Ele e a família voltaram para o seu habitat preferido: margens do Rio Paranaíba. Isso após ficarem escondidos em outras regiões de Goiás, por muito tempo, por causa do crime. Na primeira e segunda vez, que foi preso, mesmo algemado, Afonso contou com a fúria do rio a seu favor, após chuvas. No romance, Afonso tinha uma relação filial com o Rio Parnaíba (Paranaíba), que o protegia, de acordo com o seu pensamento. Na terceira, mesmo vigiado por 20 soldados goianos, fugiu por uma gruta, sob uma cachoeira, e atravessou para a outra margem (possivelmente, Minas Gerais). E salvou-se. É o demônio das águas, disse um dos policiais. 

ENTENDIMENTO DE BERNARDO GUIMARÃES – O escritor afirma no final que “o Índio Afonso não é um facínora, mas sim um homem cheio de belas qualidades, porém vivendo quase no estado natural no seio das florestas...” Veredicto de Guimarães: “... não consta que Afonso tenha cometido outro homicídio a não ser o narrado...” (morte do agressor da irmã e dos sobrinhos). 

CONCLUSÃO: GUIMARÃES NÃO CONHECEU O “AFONSO” POSTERIOR – Índio Afonso, do Bernardo Guimarães, é o personagem (real+imaginação) no cenário de 1861, quando ele era juiz em Catalão. Escreveu o romance dez anos depois, em 1872/1873, já em Ouro Preto (capital). “O herói deste conto, há dez anos, era vivo e moço ainda. É de crer que ainda exista, e que já tenha fabricado novos assuntos para histórias...” escreveu Bernardo Guimarães em 28 de fevereiro de 1873 (Ouro Preto).
 
PORTANTO... – O célebre escritor não teve notícia (até 1873), de como se portou o Índio Afonso de 1861 até 1887. Época da amizade da família Rabelo com a família Afonso. 

O COMEÇO DOS AFONSOS EM PATROCÍNIO – Em 1832, conforme o Mapa da População (primeiro Censo de Patrocínio), havia 239 fogos (casas) e 1649 pessoas no distrito, sendo 1.060 pessoas livres e 589 cativos (escravos). No fogo 206 moravam 17 pessoas. Todos de cor parda. Vicente Afonso com 26 anos, Clemente Afonso (28 anos), Francisco Afonso (9 anos), José Afonso (6 anos), Tarcísio Afonso (12 anos) e mais doze pessoas de idades variadas mas sem “Afonso”. Livres, lavradores e somente o Vicente casado. 

PATROCÍNIO E O ÍNDIO AFONSO – Nessa casa (fogo) identificada pelo Censo de 1832, onde moravam 17 pessoas, a maioria “Afonso”, inclusive crianças de 3, 6, 8, 9 e 12 anos de idade, muito possivelmente é o berço do Índio Afonso. “Índio” é um apelido vindo de sua cor parda. Ele tinha o hábito de não informar o seu nome certo, por onde andava. Seria o menino José Afonso (6 anos) em 1832? Ou Francisco Afonso (9 anos)? Ou ainda Tarciso (?) Afonso (12 anos)? Pelas informações de Bernardo Guimarães de como era Índio Afonso em 1861, José Afonso é o mais provável de ser o Índio Afonso em 1832. Principalmente, por ser o caçula. Havia outra criança de 6 anos, mas não era Afonso. E uma de 3 anos, porém do sexo feminino (Clemência Maria). Em 1861, quando Bernardo Guimarães o conheceu, Índio Afonso deveria ter por volta de 35 anos. 

MAS... SE CONSIDERAR A GAZETA DE UBERABA – Esse jornal, edição de 6/4/1887, noticiou que, em janeiro/1887, Índio Afonso foi morto, aos 80 anos de idade. Então, Índio Afonso pode ser também o Vicente Afonso (26 anos) ou Clemente Afonso (28 anos) em 1832, moradores do “fogo” 206. Então, fica a dúvida de qual patrocinense do “206” é o temido Índio Afonso. 

QUEM FOI – Bernardo Guimarães (1825-1884) nasceu e faleceu em Ouro Preto. Viveu também em Uberaba e Campo Belo. Juiz por duas vezes em Catalão (1852/1854 e 1861/1864). Em 1864/1865, morou no Rio de Janeiro. Magistrado, jornalista, professor, romancista e poeta. Patrono da cadeira nº 5 da Academia Brasileira de Letras. Entre as suas obras, “A Escrava Isaura” (1875), “O Ermitão de Muquém” (1864), “O Seminarista” (1872), “O Garimpeiro” (1872), “O Índio Afonso” (1873) e “Rosaura, a Enjeitada (1883). Pai de oito filhos (um deles chamado Afonso) e teve cinco irmãos (um irmão juiz municipal em Patrocínio, Joaquim Caetano da Silva Guimarães, em 1852/1853). 

FONTES – Livro Índio Afonso, de Bernardo Guimarães. Mapa Populacional (Censo) de 1832, Arquivo Público Mineiro. E acervo do cronista. 

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