Página do diário de Cecílio de Souza de 22 de março de 1972

Luiz Antônio Costa | O Som da Memória
Nenê Constantino, ou Constantino de Oliveira, construiu um império de transporte a partir de Patrocínio. Começou com o Expresso União, depois incorporou centenas de empresas de ônibus e, há alguns anos, passou o comando para os filhos. O conglomerado, já poderoso, chegou ao transporte aéreo, fundando a famosa Gol. Mais recentemente, a família diversificou ainda mais, entrando no ramo de transporte sobre trilhos, sendo atualmente dona do metrô de Belo Horizonte.

O que quero destacar é que muitas pessoas de Patrocínio começaram e ainda trabalham para essa família, inclusive algumas foram levadas para São Paulo. Um desses patrocinenses é o acadêmico Cecílio de Souza, membro da Academia Patrociniense de Letras (APL). Depois de 40 anos em São Paulo, prestando serviços para a família – mais especificamente para o patriarca Nenê Constantino – ele retornou à sua terra natal. E é dele que vou contar uma história fascinante.

Cecílio não é acadêmico por acaso. Sempre foi apaixonado pelas letras, desde criança. Seu pai, Ignácio de Souza – o famoso "Ignácio Verdureiro" –, dono de uma loja no mercado municipal de Patrocínio, também era um grande contador de histórias. Nos tempos de carroceiro na Casa Ribeiro, ele conquistava os colegas de trabalho e amigos com suas narrativas, especialmente no horário de almoço, na esquina da Faria Pereira com Cesário Alvim. Inclusive, fiz uma reportagem com ele, que está disponível no canal da Rede Hoje no YouTube.

Livro "Ecos do Cotidiano" de Cecílio de Souza

Foi desse legado que Cecílio herdou a arte de contar histórias. Se você, leitor, quiser comprovar o que estou dizendo, vá à Biblioteca Municipal de Patrocínio e pegue o livro do acadêmico intitulado "Ecos do Cotidiano", publicado pela editora Yendis. O livro é uma "coletânea de pérolas e situações burlescas, comuns do dia a dia de todos nós", como descreve a capa. São 240 páginas de histórias divertidas, que capturam a essência da vida cotidiana, como lembra o saudoso Marlenísio Ferreira na contracapa: "Ínfimos detalhes que compõem a existência".

Ainda jovem, Cecílio tinha o hábito de escrever diários todas as noites, antes de dormir. "Ainda tenho os meus diários encadernados, que cobrem seis anos (1970/76). São 1500 páginas escritas em 1500 dias consecutivos!", conta com orgulho. E completa: "Imagina, esses diários cobrem todo o meu cotidiano, dos 17 aos 23 anos – uma fase mágica da adolescência. Eu não me deitava sem preencher uma página inteira, seja a hora da noite ou madrugada, quando chegava em casa."

Eu sugeri que Cecílio transformasse esses diários em livros, para que ele, sua geração e até a história da cidade pudessem se beneficiar. O acadêmico respondeu que "poderia pensar nisso, sim". Então, o que está esperando, amigo? Pergunto.

Por que sei sobre os diários? No ano passado, quando a turma de Cecílio completou 50 anos do Tiro de Guerra, ele usou um desses diários para contar uma história da turma e fez um grande sucesso. Mas o que me trouxe até aqui foi o seguinte que, hoje, escrevi uma matéria sobre um documentário para TV que estão produzido sobre o "Monstro de Capinópolis", Orlando Sabino, para a TV Brasil. Logo após a publicação desta reportagem, Cecílio me chamou no WhatsApp e contou que havia ido à delegacia para identificá-lo.

Ele registrou, em seu diário, na quarta-feira, 22 de março de 1972, o seguinte: "O assunto do dia é o Monstro de Capinópolis, que tanto se fala e agora está preso em Patrocínio, fazendo reconstituições. Eu, juntamente com Elísio Bacatusca e mais quatro, fomos convidados para um exame de identificação com o louco, para uma mulher apontar o verdadeiro assassino de seu pai. A cidade foi tomada; a cadeia, a delegacia e outros lugares por onde ele passou ficaram interditados. O número de curiosos era impressionante", descreve no texto do diário.

E, na página seguinte, Cecílio brinca: "O dia seguinte ao 'Monstro' em Patrocínio: minha mãe ficou frustrada por não ter podido vê-lo. Rsrs." E encerra a mensagem com um sorriso.

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