Cultura. Tem que ser referenciada. E respeitada. Isso em qualquer lugar, seja cidade, país ou comunidade. No que tange a Patrocínio, município de 180 anos, vida (existência) de mais de 250 anos, o tributo cultural ainda é frágil. No intuito de demonstrar a inteligência patrocinense, é bom viajar pelo tempo. E conhecer alguns intelectuais, que se tornaram marcos culturais e históricos dessa Santa Terrinha.
NA INDEPENDÊNCIA JÁ HAVIA DESTAQUE – Em 1819, o cientista e naturalista francês Auguste de Saint Hilaire visitou a região de Patrocínio. No seu livro “Viagem às Nascentes do Rio São Francisco” descreveu a natureza e riqueza da área abrangida por Araxá, Patrocínio e Paracatu. Na viagem de Araxá para (o distrito de) Patrocínio, hospedou com a sua comitiva, na fazenda de Dâmaso José da Silva, entre onde é hoje o distrito de Salitre e Serra do Salitre. Saint Hilaire o considerou homem excelente e com nível cultural superior a todos os fazendeiros que vira. Segundo o pesquisador europeu, Dâmaso era bem informado e de pleno conhecimento. Pouco depois, em 1832-1835, liderou o Levantamento Populacional (considerado o primeiro censo de Patrocínio). Em 1842, além de juiz (ordinário), delegado e intelectual reconhecido, tornou-se um dos sete primeiros vereadores do Município. E o mais atuante. A documentação em arquivos mostra a lucidez e liderança de Dâmaso.
JUIZ DE ENORME SAPIÊNCIA – No período de 1817-1822, o médico-geólogo austríaco Johann Emanuel Pohl também esteve na região de Patrocínio. Hospedou na fazenda à beira do rio Quebra-Anzol, do juiz Xavier Matias. Pohl, diferente do que tinha visto, viu no juiz Xavier cultura e civilidade acima de seus contemporâneos. Refeições requintadas, bons vinhos da Europa, louças inglesas e talheres de prata, dentre as anormalidades daquele distante cotidiano do interior brasileiro. Inclusive no Arraial de N. S. do Patrocínio.
UM PADRE INTELECTUAL – Em dezembro de 1822 (a independência ocorrera em setembro), foi encaminhada ao Imperador representação da população regional, de impressionante beleza literária; uma obra-prima da língua portuguesa. Essa preciosidade histórica, como disse Odair de Oliveira, solicitava a criação do julgado (Juiz de Paz) de Patrocínio ao Imperador Pedro I. Dezenas de moradores de Patrocínio, Coromandel e Monte Carmelo (então, denominado Carmo) assinaram o documento. O vigário Manuel Luis da Silva Alcobaça, como sesmeiro e autor do pedido, assinou em primeiro lugar. Depois, ele pertenceu à Guarda Nacional (em Patrocínio) e casou-se.
CULTURA VENCEU A FÚRIA DO PODEROSO – Em 1853, surgiu Francisco Alves de Souza. Defensor do Direito e das Leis, leitor dos maiores pensadores (escritores) do mundo. Uma de suas fantásticas atuações, é do equacionamento do maior conflito vivido na Câmara Municipal. O delegado de Polícia, Antônio Corrêa Rangel (o segundo Rangel na história de Patrocínio), foi eleito vereador. Todos os vereadores eleitos tomaram posse, exceto o delegado Rangel. Pois, seria incompatível essa acumulação dos cargos. Rangel não aceitou não ser empossado e ameaçou a prender todos os vereadores. A Câmara funcionava no Largo do Rosário (hoje, atrás da Escola Honorato Borges), juntamente com o Juizado, no 2º andar. E a era cadeia no 1º andar. Portanto, fácil para Rangel executar a prisão. Quando o prédio estava cercado pelos policiais e simpatizantes do inquieto delegado, entra em cena a sabedoria e moderação de Francisco Alves de Souza, que consultou a Província (Estado) em Ouro Preto, sobre a questão. As autoridades provinciais recomendaram a posse de Rangel. E os vereadores, “tremendo de medo”, ainda elegeram o delegado-vereador para presidente da Câmara, e por consequência, o agente executivo (prefeito). Por isso, Rangel foi o patrocinense com maior poder até hoje (Executivo, Legislativo e policial).
CEL. RABELO TAMBÉM UM INTELECTUAL – Deputado provincial por dois mandatos no Império, Rabelo queria mais. Conseguiu ser eleito para o Senado. Todavia, o Imperador Pedro II teria que confirmar (aceitar) a eleição. Contudo, a Proclamação da República e o assassinato do juiz Elói Ottoni pelos Índios Afonsos, o impediram de conquistar o título confirmado de senador, e, desfrutar o título de barão de Patrocínio (único). Assim, foi o coronel Joaquim Antônio de Souza Rabelo, primeiro parlamentar eleito na região, de evolução mental tal como a de Francisco Alves de Souza, segundo a história.
E O DESFILE DOS INTELECTUAIS CONTINOU NO SÉCULO XX – Em 1900, Josias Batista e Leovigildo de Paula (poeta), com “O Patrocínio” (o primeiro jornal da cidade), prosseguiu a saga da inteligência. Como também, Zeca Estudante (filho de Francisco Alves), com a criação da primeira escola (futura Honorato Borges), Padre Nicolau Catalani, Padre Joaquim Tiago, Carlos Pierucetti, poetas como Massilon Machado e Augusto de Carvalho, e, maestro José Carlos da Piedade (autor de “Saudade de Matão”). Sobre eles e mais outros cultos personagens de Patrocínio numa próxima oportunidade.
FONTES – Jornalista patrocinense Odair de Oliveira, Arquivo Público Mineiro e arquivo particular deste autor.
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