Número de óbitos de crianças no Brasil é maior do que observado em outros países; maior risco foi para os grupos de crianças indígenas, de regiões mais pobres, com comorbidades, adolescentes ou menores de um ano


Foram analisados dados de 82.055 crianças internadas em hospitais brasileiros, públicos e privados, em 2020, com suspeita da doençaFoto: Manuel Darío Fuentes Hernández|Pixabay


Da Redação da Rede Hoje
Uma pesquisa da Faculdade de Medicina da UFMG, publicada na última quinta-feira, 10 de junho, na revista The Lancet Child and Adolescent Health, traçou o perfil das crianças brasileiras hospitalizadas com covid-19. Entre os principais achados, fatores como a vulnerabilidade social e menor acesso à saúde pesaram tanto quanto comorbidades para o pior prognóstico das crianças brasileiras quando comparadas aos estudos publicados na literatura internacional. 

Para traçar esse perfil, foram analisados dados de 82.055 crianças internadas em hospitais brasileiros, públicos e privados, em 2020, com suspeita da doença. Destas, 11.613 tiveram comprovação laboratorial da infecção pelo SARS-CoV-2 e foram incluídas na análise. Esta é a maior coorte pediátrica de covid-19 já publicada no mundo até o momento.
Entre esses pacientes, 886 (7,6%) morreram no hospital. A taxa chama a atenção dos pesquisadores ao comparar com uma coorte prospectiva no Reino Unido com crianças hospitalizadas que apontou para mortalidade de 1% (todas com comorbidades). “Entendemos que os poucos recursos disponíveis para a assistência à saúde, incluindo a pouca disponibilidade de UTI pediátricas, pode ter impactado nessa realidade”, destacam.
 
O estudo analisou dados de crianças hospitalizadas, ou seja, com formas moderadas e graves, não incluindo dados sobre as formas leves. Entre os fatores de risco para maior mortalidade foram identificadas a idade, a etnia, a macrorregião geográfica de origem e a presença de comorbidades.

No fator idade, a mortalidade foi maior entre menores de 2 anos e em adolescentes (entre 12 a 19 anos). Pacientes da região Nordeste ou Norte do país também tiveram maior risco de um desfecho adverso comparado aos da região Sudeste. Crianças indígenas tiveram pelo menos o dobro de risco de morte em relação às de outras etnias. Outro ponto observado foi o aumento progressivo da incidência de mortes a partir do número de comorbidades, ou seja, o risco do desfecho negativo é maior a cada doença pré-existente a mais que a criança tenha. 
Além dos 886 (7,6%) pacientes pediátricos que morreram no hospital (em uma média de 6 dias após a admissão hospitalar), o estudo revela que 10.041 (86,5%) pacientes receberam alta do hospital, 369 (3,2%) estavam no hospital no momento da análise e 317 (2,7%) não tinham informações sobre o desfecho. A probabilidade estimada de morte foi de 4,8% durante os primeiros 10 dias após a internação, 6,7% nos primeiros 20 dias e 8,1% ao final da análise.
 
Segundo os pesquisadores, a principal conclusão do estudo é que, como já verificado em estudos nacionais e internacionais de pacientes adultos, as desigualdades sociais e nos cuidados de saúde podem contribuir para aumentar o impacto negativo da doença em crianças e adolescentes mais vulneráveis e socioeconomicamente desfavorecidos no Brasil. “Fatores sociais e biológicos parecem estar intrinsecamente interligados e podem agir sinergicamente para aumentar o impacto da doença para esta população mais vulnerável”, entendem. Outro ponto que defendem é que as necessidades específicas de pacientes pediátricos mais suscetíveis devem ser consideradas no contexto de futuras direções para medidas preventivas e estratégias terapêuticas para esses grupos.  
Os dados foram coletados do Sistema de Informação da Vigilância Epidemiológica da Gripe (SIVEP-Gripe), que é um banco de dados nacional com pacientes dos sistemas público e privado. A equipe da pesquisa extraiu do sistema todos os casos confirmados de covid-19 referentes à população pediátrica (menores de 20 anos), entre 16 de fevereiro de 2020 e 9 de janeiro de 2021.

O estudo contou com recursos da FAPEMIG e do CNPq e foi conduzido pelos professores Eduardo Oliveira, Ana Cristina Simões e Silva e Maria Christina Lopes, do Departamento de Pediatria da Faculdade, com a participação do professor Enrico Colosimo, do Departamento de Estatística (UFMG), dos pesquisadores da Universidade Estadual de Montes Claros (Unimontes) Hercílio Martelli-Júnior e Daniella Barbosa Martelli, do pesquisador Robert Mak, da University of California, San Diego, e da aluna Ludmila R. Silva, da Faculdade de Medicina e bolsista da iniciação científica pelo CNPq.
 
Fonte: Centro de Comunicação Social da Faculdade de Medicina da UFM

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