
Deputados aprovaram, em primeiro turno, a PEC 24/23, que permite a privatização da Copasa sem consulta popular debaixo de ruidosos protestos.
Da Redação da Rede Hoje
A Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) aprovou, em primeiro turno, na madrugada desta sexta-feira (24), a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 24/23, que dispensa a realização de referendo popular para autorizar a privatização da Companhia de Saneamento de Minas Gerais (Copasa). A proposta é de autoria do governador do Estado.
A sessão extraordinária teve início às 18h de quinta-feira (23) e se estendeu até as 4h30 da manhã desta sexta. Durante o período, o governo convocou novas reuniões extraordinárias à meia-noite, às 6h e às 12h, para garantir a continuidade dos trabalhos. A votação foi concluída com 52 votos favoráveis e 18 contrários.
No início da reunião, o painel do plenário registrava a presença de 55 deputados. Com o decorrer da sessão, o quórum aumentou para 71 parlamentares. As galerias ficaram ocupadas por manifestantes contrários à proposta, e grupos também se concentraram do lado de fora do Palácio da Inconfidência.
O cenário da votação
Os trabalhadores protestaram. Foto: ALMG
A PEC 24/23 tem como principal objetivo dispensar a consulta popular para autorizar a privatização ou federalização da Copasa, quando a medida for destinada ao pagamento de dívidas do Estado com a União. O texto aprovado em primeiro turno também permite a alienação da empresa para cumprimento de outras obrigações financeiras vinculadas a programas de renegociação.
O governo de Minas Gerais pretende utilizar os recursos provenientes da venda ou federalização da Copasa para abater 20% do saldo devedor com a União. O abatimento é condição para adesão ao Programa de Pleno Pagamento das Dívidas dos Estados (Propag), que prevê taxa de juros zero aos entes que cumprirem as exigências.
Segundo a proposta, o valor obtido poderá ser destinado ainda a investimentos em áreas como educação e infraestrutura. A medida faz parte da estratégia do Executivo estadual para equilibrar as contas públicas e reduzir o comprometimento orçamentário com o serviço da dívida.
Durante a tramitação da PEC, o governo argumentou que o referendo popular poderia atrasar o processo de adesão ao programa federal, dificultando a repactuação. Já os opositores sustentaram que a exclusão da consulta representa uma limitação à participação cidadã nas decisões sobre bens públicos.
Obstrução da oposição
Desde o início da sessão, os parlamentares da oposição se revezaram na tribuna com o objetivo de retardar a votação da PEC. O deputado Professor Cleiton (PV) e o deputado Leleco Pimentel (PT) abriram os trabalhos pedindo a palavra para discutir a ata da reunião anterior, em uma das manobras regimentais de obstrução.
O líder do bloco oposicionista, deputado Ulysses Gomes (PT), apresentou requerimento pedindo o encerramento da reunião em sinal de pesar pela morte do cabo Vinícius de Castro Lima, assassinado ao tentar impedir um assalto em Belo Horizonte. O pedido foi rejeitado, mas os deputados realizaram um minuto de silêncio em homenagem ao policial.
Na sequência, a oposição apresentou outros requerimentos, como o de inversão de pauta, que também não foram acatados pela Presidência da Casa. Os discursos se concentraram em críticas à condução do governo estadual e à ausência de consulta pública sobre a venda da empresa de saneamento.
Os deputados contrários à proposta citaram experiências de privatizações em outros estados e países, apontando supostos prejuízos à população em casos semelhantes. A bancada oposicionista afirmou que a Copasa é financeiramente sustentável e que a privatização colocaria em risco a prestação de serviços básicos.
Discussões prolongadas

Mesmo com obstruções, o Presidência recompôs a presença dos parlamentares, garantindo a continuidade dos trabalhos e o prosseguimento da votação. Foto: ALMG
Durante a madrugada, diversos parlamentares ocuparam a tribuna para se manifestar sobre o tema. Entre eles estavam Ulysses Gomes (PT), Cristiano Silveira (PT), Ricardo Campos (PT), Doutor Jean Freire (PT), Betão (PT), Celinho Sintrocel (PCdoB) e Luizinho (PT). Deputadas como Beatriz Cerqueira (PT), Bella Gonçalves (Psol), Andreia de Jesus (PT) e Leninha (PT) também participaram dos debates.
A deputada Lohanna (PV) e o deputado Hely Tarqüínio (PV) ressaltaram a importância de ampliar o diálogo com a sociedade antes de qualquer decisão sobre a Copasa. Outros, como Marquinho Lemos (PT) e Ana Paula Siqueira (Rede), pediram mais transparência nos cálculos que envolvem a dívida do Estado e o valor da empresa.
Em algumas ocasiões, os deputados da oposição deixaram o plenário na tentativa de derrubar o quórum mínimo necessário para a votação. No entanto, a Presidência recompôs a presença dos parlamentares, garantindo a continuidade dos trabalhos e o prosseguimento da votação.
A base governista, representada por Cássio Soares (PSD), Noraldino Júnior (PSB) e Roberto Andrade (PRD), conseguiu aprovar requerimentos que determinaram a votação nominal de todos os questionamentos apresentados. A medida visava acelerar o processo diante das tentativas de obstrução.
Encaminhamentos finais
Após o debate sobre os requerimentos, Ulysses Gomes (PT) apresentou novo pedido de adiamento da votação da PEC. O requerimento foi novamente rejeitado pelo plenário. A oposição continuou se manifestando até os minutos finais da reunião.
Nas últimas horas da madrugada, os deputados da base do governo concentraram seus esforços na condução da votação. A aprovação da PEC foi alcançada pouco depois das 4h da manhã, encerrando uma das sessões mais longas do ano na Assembleia Legislativa de Minas Gerais.
Com a aprovação em primeiro turno, a proposta será agora encaminhada à Comissão Especial responsável pela análise da matéria. O colegiado deverá elaborar novo parecer antes da votação em segundo turno, que definirá se o texto será promulgado ou arquivado.
Próximos passos
A tramitação da PEC continuará sob atenção de grupos contrários à privatização da Copasa. Entidades sindicais, associações de servidores e movimentos sociais anunciaram que irão acompanhar as próximas etapas.
O governo estadual informou que a votação representa um passo importante para a renegociação da dívida mineira e que a proposta não prevê a venda imediata da empresa, mas apenas autoriza a dispensa de consulta popular.
A oposição, por sua vez, pretende recorrer a medidas jurídicas e políticas para tentar barrar o avanço da PEC. Segundo deputados do bloco, o governo não apresentou estudos detalhados sobre o impacto da privatização nos serviços e tarifas.
A discussão sobre a Copasa ocorre em meio a um cenário de dificuldades fiscais enfrentadas por Minas Gerais. O Executivo busca reduzir o déficit financeiro e obter novas condições de pagamento junto à União, o que exige a adesão ao programa federal.
Repercussão política
A aprovação em primeiro turno da PEC provocou reações dentro e fora do Parlamento. Foto: ALMG
A aprovação em primeiro turno da PEC provocou reações dentro e fora do Parlamento. Integrantes da base governista comemoraram o resultado como uma vitória administrativa e legislativa, destacando o alinhamento político entre Executivo e Legislativo.
Entre os opositores, o clima foi de indignação. Parlamentares e representantes de movimentos sociais afirmaram que o governo estaria abrindo caminho para a privatização de um serviço essencial sem ouvir a população.
Mesmo com o avanço da proposta, a expectativa é de que a votação em segundo turno ocorra somente após a elaboração do parecer da Comissão Especial. O texto final ainda poderá receber emendas ou ajustes formais antes de sua redação definitiva.
O debate sobre o futuro da Copasa continuará a mobilizar diferentes setores da sociedade mineira. A empresa é responsável pelo abastecimento e tratamento de água em mais de 600 municípios do Estado, o que amplia o interesse público em torno do tema.
Com a PEC 24/23 aprovada em primeiro turno, o governo de Minas Gerais tenta consolidar uma base política sólida para garantir o êxito da matéria no segundo turno. O desfecho definirá o rumo das políticas de saneamento e da gestão de ativos públicos no Estado.