Presidente do Conselho Nacional do Café alerta para riscos à soberania tecnológica e produtiva do setor cafeeiro


Presidente do CNC, Silas Brasileiro, em reunião com a presidente da Embrapa, criticou tentativas de incluir o café no tratado internacional — Foto: Divulgação/CNC

Da Redação da Rede Hoje

O Conselho Nacional do Café (CNC) manifestou, nesta semana, preocupação com propostas que visam incluir o café brasileiro no escopo do Protocolo de Nagoya — tratado internacional que regula o acesso a recursos genéticos e a repartição de benefícios derivados de sua utilização. O posicionamento foi divulgado após reunião entre o CNC e a presidente da Embrapa, Sílvia Massruhá, na qual foram apresentados argumentos contrários à proposta.

Segundo o presidente do CNC, Silas Brasileiro, a inclusão do café no protocolo pode comprometer a soberania nacional sobre pesquisas, materiais genéticos e tecnologias desenvolvidas ao longo de décadas com investimento público. Para ele, o Brasil corre o risco de ver seu banco de germoplasma e conhecimento técnico transferidos a países concorrentes que não enfrentam os mesmos controles ambientais e sociais.

Silas destaca ainda que o setor cafeeiro brasileiro é um dos mais importantes da economia nacional, responsável por cerca de 8,4 milhões de empregos em quase dois mil municípios espalhados por 17 estados. O dirigente também critica o que considera uma tentativa de impor ao Brasil restrições baseadas em relatórios climáticos com viés econômico e não técnico.

Na avaliação do CNC, a inclusão do café no Protocolo de Nagoya favoreceria outros países produtores em detrimento da cafeicultura nacional, que opera sob uma das legislações ambientais mais rigorosas do mundo. “O momento exige clareza, responsabilidade e posicionamento”, afirmou Silas.

Veja abaixo o artigo na íntegra assinado por Silas Brasileiro, presidente do CNC:

Por Silas Brasileiro – Presidente do Conselho Nacional do Café (CNC)

O Brasil é o maior produtor e exportador de café do mundo. Este protagonismo, conquistado com muito esforço e competência, não é fruto do acaso, mas sim da capacidade técnica, da resiliência dos nossos produtores e da articulação contínua entre os setores público e privado. Por isso, é com enorme preocupação que o Conselho Nacional do Café (CNC) acompanha as tentativas de inclusão da cafeicultura brasileira no Protocolo de Nagoya, o que pode abrir portas à transferência irrestrita de nosso banco de germoplasma, estudos, pesquisas e tecnologias estratégicas para países concorrentes que não enfrentam os mesmos desafios regulatórios e socioambientais do Brasil.

É preciso compreender a gravidade desse cenário. A inclusão do café neste protocolo representa não apenas o risco de se perder a soberania sobre o nosso conhecimento científico acumulado ao longo de décadas, mas também a possibilidade de comprometer toda a cadeia produtiva nacional. Estamos falando de um setor que gera cerca de 8,4 milhões de empregos, está presente em 17 estados, 1.983 municípios, 6 biomas diferentes e é um dos grandes pilares sociais e econômicos do país.

Enquanto o produtor brasileiro precisa cumprir normas rigorosas, com uma das legislações ambientais mais avançadas do mundo, outros países produtores operam à margem de qualquer regulação. Isso gera um desequilíbrio injustificável de competitividade. O que se observa é que, ao invés de valorizar o modelo produtivo responsável e sustentável do Brasil, forças externas — muitas vezes impulsionadas por organizações com interesses comerciais — buscam impor padrões que fragilizam nosso setor, tentando ainda ditar o futuro da cafeicultura através de relatórios enviesados sobre mudanças climáticas ou perda de produtividade.

A verdade é que o Brasil possui uma cafeicultura resiliente e adaptável. Já demonstramos isso com a migração produtiva de estados como Paraná e São Paulo para regiões do Cerrado Mineiro, do Sul da Bahia, de Rondônia, do Espírito Santo e até do Nordeste brasileiro. Se há impacto climático em uma região, temos estrutura e diversidade de biomas para reorganizar a produção sem comprometer o abastecimento global.

A tentativa de submeter o setor cafeeiro brasileiro aos moldes do Protocolo de Nagoya levanta uma questão fundamental: vamos defender os interesses de nossos produtores ou permaneceremos inertes diante de um movimento que ameaça nossa soberania e o futuro da nossa produção?

O CNC tem se posicionado de forma firme e incansável em todas as instâncias, nacionais e internacionais, buscando esclarecer e denunciar essas movimentações silenciosas, porém perigosas, que se travestem de iniciativas de cooperação, mas que escondem interesses econômicos profundos. A transferência de material genético e conhecimento técnico construído com recursos públicos, com o apoio da Embrapa, do Consórcio Embrapa Café, de universidades, institutos – com investimento vultuoso nos últimos anos — não pode ser feita de forma impensada ou subserviente.

Não é por demais lembrar que além do aspecto ambiental, a produção de café no Brasil também tem um forte compromisso com a sustentabilidade social, já que os direitos trabalhistas no país garantem proteção e segurança aos trabalhadores e trabalhadoras. Eles abrangem questões como salário mínimo, jornada de trabalho, férias remuneradas, décimo terceiro salário, descanso semanal, licenças maternidade e paternidade, seguro-desemprego, entre outros. Cabe ressaltar que a proteção à saúde do trabalhador também é promovida pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e pelo Sistema Único de Saúde (SUS), sendo o país um dos únicos no mundo a disponibilizar esse serviço de forma pública e gratuita.

Portanto, além do produtor, toda uma cadeia seria afetada com essa proposta: as cooperativas, as indústrias, os fornecedores de insumos, os prestadores de serviço, os exportadores. Estamos falando de um setor que movimenta bilhões e que é responsável por parcela significativa da balança comercial do país.

O momento exige clareza, responsabilidade e posicionamento. O CNC reitera seu compromisso com a defesa do produtor e da produção nacional, e continuará atento e atuante para garantir que o Brasil siga como referência mundial em produtividade, sustentabilidade, tecnologia e — acima de tudo — soberania.
SILAS BRASILEIRO
Presidente do Conselho Nacional do Café (CNC)


Todas as notícias